Voto técnico x voto político

27 de fevereiro de 2014

Em recente sessão do STF (ação penal n° 470, mais conhecida como mensalão), o Ministro Joaquim Barbosa, indignado com o Ministro Luis Roberto Barroso, afirmou que o seu voto não era “técnico”, mas “político”. Na visão do Ministro Joaquim, somente o voto dele, Joaquim, é técnico, isto é, juridicamente fundado. Já o voto do Ministro Barroso seria político, logo, arbitrário (possivelmente). Subjacente a esse discussão está a ideia de que o técnico e o político são substancialmente distintos.

Mas isso é inconsistente.

É que toda decisão técnica é uma decisão política, embora nem toda decisão política seja técnica. Afinal, a técnica jurídica é um modo político, não o único, nem necessariamente o melhor, de resolver conflitos. O direito é uma dimensão da política.

Primeiro, porque o direito é produto das instituições e órgãos constitucionalmente competentes para realizar a jurisdição, ou seja, é uma forma de gestão política de conflitos. Justamente por isso, só é direito o que o poder reconhece como tal. Uma decisão tomada pelos ministros do STF durante um churrasco no final de semana, por exemplo, não teria absolutamente nenhum valor jurídico, pois não estaria conforme os cânones e rituais ditados pela Constituição.

Segundo, porque ambos os votos recorrem a elementos técnicos e, pois, os fundamentada tecnicamente.

Terceiro, porque toda decisão judicial é resultado da vontade de poder de quem a produz. Afinal, todo aquele que decide tem a sua decisão como a mais acertada, ainda quando revê posicionamento anterior ou adere à opinião de outrem, e assim faz ou tenta fazer prevalecer suas decisões nos espaços de poder em que atua.

Quarto, porque a melhor técnica não conduz, ou não conduz forçosamente, a uma única decisão correta, mas a diversas. Exatamente por isso, é possível partir dos mesmos elementos técnicos e, não obstante, chegar a conclusões distintas ou opostas.

Em suma, tanto o voto do Ministro Joaquim Barbosa quanto o voto do Ministro Barroso são igualmente técnicos, logo, políticos. O que sempre se poderá questionar é a técnica utilizada e respectiva fundamentação, para valorá-la como boa ou má.

 

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3 Comentários

  1. Professor,

    Tenho a impressão de que um fenômeno extremamente problemático tem ocorrido nos julgamentos das ações penais originárias no STF.

    No caso do mensalão, o ministro Barroso alegou que as penas foram desproporcionalmente altas (ministro Teori também), e que se tivessem sido dosadas de forma proporcional, ocorreria a prescrição.

    Daí está o grande dilema: se o STF aplica uma pena proporcional, ocorre a prescrição e não são punidos pelo crime que cometem. Ou seja, teríamos uma decisão injusta – embora tecnicamente perfeita. Se o Tribunal aumenta a pena, violando de propósito a proporcionalidade para não ocorrer prescrição, também ocorre uma injustiça!

    Agora vejamos o caso do ex-deputado federal Donadon, condenado a mais de 13 anos por peculato e quadrilha. Na época, os advogados alegaram que outros coautores tinham maior culpabilidade (sentido amplo), mas receberam penas muito menores do Judiciário de 1º e 2º graus, pois os coautores não foram julgados em única instância pelo STF.

  2. Professor PQ, senhores comentaristas.

    Se fores condenado a 10 chibatadas, não poderás receber 11. Bíblia.

    Duas coisas põem-me a refletir nesta ação penal 470. O fenômeno da prescrição e da falta de celeridade processual das proposituras que tramitam pelo judiciário no seu todo, não, especialmente na corte suprema. Inclusive com o acréscimo de que não houve o duplo grau de jurisdição. Na minha parca compreensão um retrocesso. Ainda que ressalvada a necessidade de punir pelos crimes de corrupção, a chaga cancerígena da sociedade.
    Outro fato comumente repetitivo nos nossos tribunais é a morosidade nos julgamentos e que leva muitos processos à prescrição. De modo que a sociedade não obtém a resposta de que o acusado foi culpado ou inocente.
    Quanto às discussões de Joaquim Barbosa e Luis Roberto Barroso. O primeiro extrapola na sua missão de julgar com a devida equidistância e paixão com a causa, digna de desmerecer os mais diligentes dos advogados. E este, Barroso, ainda que estivesse atendendo a interesses ocultos, demonstra coerência processual. Lembrando, inclusive, que não os técnicos que faz as leis, muito embora, os senhores políticos as faça com o assessoramento de juristas.
    Rogério Lima.

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